Coluna do Adilson Cardoso – O conto seguinte
Gemidos ecoavam das fendas que se abriram no chão da cozinha. Pelas rachaduras do teto era possível ver a lua cheia se apagando no céu. Pessoas já falecidas faziam o jogo dos copos, chamavam espíritos na mesa do café. Guido seu amigo assassinado há poucos dias, tinha um buraco na cabeça onde se expunham miiases, ele batia palmas com uma mão sem os dedos. Enquanto os copos giravam um enorme estrondo se ouviu no aquário, os peixes desesperados voaram atrás de uma borboleta que saiu da boca de Cordélia. Nuvens negras se ancoraram no teto, porcos desciam delas tocando Trombetas, uma cruz enorme estava fincada ao lado da porta onde um Rato gigante uivava crucificado. Cordélia arrancou sua própria cabeça com uma faca de pão, crianças vestidas com mortalhas cantavam musicas do Black Sabbath. No espelho do banheiro havia uma escada guardada por uma Serpente, do forno do fogão sairam formigas transportando olhos humanos. A mãe de Cornélia estava presa num vidro de maionese, seu olhar era tranquilo, ela apontava para as pessoas na mesa e marcava na lateral do frasco. Um Besouro gigante surgiu do ralo da pia arrastando um caixão com uma corda lilás, ele soprou um apito e andou pela casa inteira fazendo arabescos, até entrar pelo forno do fogão de onde sairam as formigas, um novo trovão retumbou. Cordelia acordou suada com a mão no peito, parou alguns segundos olhando em volta, fechou o livro de Stephen King que estava aberto ao seu lado e virou-se para o canto da parede. Sua mãe que a observava de longe, apagou a luz e bateu a porta.