Coluna do Adilson Cardoso – Entre os caminhos do Inferno
Entre os caminhos do Inferno
Fila para mim sempre foi sinônimo de tédio, naquela data especialmente havia algo mais, estava com uma vontade louca de chegar em casa, após dias de estrada. Posto Caititu, era o nome de letras sombreadas numa placa da fachada, lia displicente. Pensei em tomar um conhaque, mas um policial de bigode grisalho, escorado numa viatura enlameada, a todo o momento olhava para mim, achei melhor não arriscar, fiança da Lei Seca estava mais caro. Chegou a minha vez na bomba de gasolina, enchi o tanque e entreguei o cartão ao frentista que me olhou de jeito estranho.
— Qual é cara, estou cagado? – Perguntei com rispidez.
Acelerei a moto e vi pelo retrovisor que o frentista se aproximava do policial, falavam olhando para mim. Optei por uma velocidade moderada para contemplar a natureza, ás chuvas que caíram nos últimos dias, havia renovado as cores das matas. Verdes de vários tons se contrastando com os vermelhos, roxos e amarelos das flores, a vista era agradável, apesar do céu turvo e duas cruzes toscas a beira da estrada. Chamou-me a atenção uma senhora que andava com dificuldades carregando um feixe de lenha na cabeça, ao seu lado se arrastava uma criança magra de pés no chão, estavam visivelmente machucados, deixando rastros de sangue por onde passavam. Aproximei-me consternado para oferecer ajuda. Buzinei, mas continuavam na peleja agonizante, gemiam, passei por eles e parei á frente, a visão era terrível, fiquei petrificado os vendo capengar feito zumbis. Seus rostos esqueléticos com porções de carnes azuladas nas maçãs do rosto, deixavam escorrer das órbitas um liquido grosso e amarelado, dos trapos das suas vestes expunham pontas de ossos feito espetos. Cheiravam a carne podre. Virei a moto e acelerei, cheguei feito louco ao lugar de onde viera, estava lívido e ofegante. O policial torcia seus bigodes grisalhos de olhos fitos em mim.
—Poderia apostar que você encontrou a velha e a criança! Já faz um ano que morreram atropelados! Mas Parece que a desgraçada não está em paz, ela escolhe alguns para vê-la, dizem que está se vingando! Não quero assustá-lo, mas esses infelizardos que a viram costumam ter fins trágicos, Mas eu não acredito. Penso que são meras coincidências, ontem a vi por volta do meio dia, mas estou tranquilo, até agora nada me aconteceu!– Falou o policial olhando reflexivamente o céu tenebroso.
O frentista ficou reparando de longe com seu jeito estranho. Minha cabeça estava dividida entre aquilo que vi e as palavras pouco animadoras do policial, sentia arrepios. De repente um chamado no radio da viatura, o homem ouve com atenção e repete positivo diversas vezes, desliga o aparelho e manobra o carro. O frentista continuava me olhando de longe, parecia uma estátua de Frankenstein, quando eu lhe encarava desviava a vista, achei melhor não perder tempo com banalidades.
— Vai se foder agourento! – Falei abotoando o capacete e pegando a estrada novamente.
Deu para enxergar a viatura em disparada, o que quer que fosse aquele chamado era urgente, aproveitei para acelerar, passaria no local das aparições com pouca diferença em relação ao policial. Fui contando placas, acelerava e reduzia sem perder o foco na viatura. De repente o carro desviou bruscamente de alguma coisa e bateu numa pedra que ficava a margem, o estrondo foi alto. Eu já estava bem perto, vi o corpo decapitado voar pelo buraco que se abriu no parabrisa. Parei sem acreditar naquela aquela cena de filme de horror, a velha saiu de dentro dos destroços do carro com a criança e a cabeça do policial nas mãos.